Crónicas de um Viciado
- Helder Teixeira
- 2 de jul. de 2015
- 3 min de leitura
Desde que Nicolas-Joseph Cugnot inventou o automóvel em 1770, poucos foram aqueles que "acertaram" 100% na receita. Maior parte dos carros, na verdade, têm defeitos ou falhas catastróficas, que por vezes os arruinam, e por outras lhes dão carácter e nos permitem gostar deles na mesma, um pouco como as mulheres. O próprio carro de Cugnot tinha umas tantas falhas, tanto que a única coisa em que "acertou", foi num muro de pedra.
Mas às vezes um carro consegue mesmo sair direito, sem motores idiotas, sem demasiado peso numa das pontas, sem caixas de velocidades inúteis, sem um design que cause vómitos, sem bancos de trás para pessoas com um metro de altura, sem uma qualidade de construção tão má que desmotive, e sem nada que prive o condutor de sentir o carro. O BMW E39 M5 foi um desses casos, mas mesmo esse descendia de um modelo com versões fracas e, por vezes, equipadas com caixas automáticas do demónio. O carro de que vou falar hoje não se mistura com carros dessa laia, e é um exemplo de nobreza automóvel a seguir. Estranhamente, as suas raízes parecem tudo menos nobres, um produto italo-americano, e correndo o risco de ser acusado de algum nível de xenofobia, faz-me pensar mais na máfia do que em pessoas que tomam chá e jogam polo, ou golf, ou passat, ou seja lá o que os ricos jogam. Mas nem mesmo o facto de este carro poder ser mafioso impediu Elvis Presley de lhe dar um tiro quando não pegou.
O carro de hoje, senhoras e senhores, é o fantástico De Tomaso Pantera.


Lançado em 1971, o Pantera substituiu o, não menos brilhante, Mangusta, mas foi produzido numa escala muito maior (7200 unidades em vez das 400 do antecessor) e resolveu as pequenas falhas do modelo anterior. A receita no entanto manteve-se, e foi isso que fez do Pantera um veículo perfeito. Um desportivo italiano, com motor americano.


Numa época em que os motores dos outros supercarros eram obras de engenharia complicadíssimas, como os V12 e os Boxer, que pareciam produzir um som mais impressionante do que a potência que realmente levavam às rodas, Alejandro de Tomaso não perdeu tempo e foi buscar o que era simples, barato, fiável e rápido, um Ford V8. E como não quis ligar o motor directamente às rodas, colocou uma coisa chamada caixa de velocidades no meio deles. Isto foi um dos aspectos que diferenciou o Pantera dos outros supercarros, é que esta caixa era uma ZF, fabricada por alemães, que não conhecem sentido de humor ao fabricar carros, apenas eficácia. E enquanto a eficácia pode ser sinónimo de aborrecimento no que toca a motores e design, na caixa de velocidades é algo que deve ser tido em conta. Infelizmente, este meu raciocínio está errado há uns bons 20 anos, porque entretanto a eficácia das caixas tornou-se uma obsessão tão grande, que as fazem sequenciais ou automáticas, eliminando o factor "prazer" e a arte de uma bela passagem com o jogo de pés ou uma redução de quinta para terceira. Mas pronto, quando faziam caixas manuais, os alemães eram muito bons.


Para além de ter um motor simples com 330 cavalos (que pelos vistos eram cerca de 380 na realidade) e uma caixa de 5 velocidades em condições, montados dentro de uma carroçaria italiana elegante e angulosa, o Pantera era um carro barato, na ordem dos 10.000 dólares, o que, mesmo com a inflação, era barato, cerca de 60.000 dólares em 2015, ou 54.000 euros. Menos do que um série 3 diesel, que não tem 330 cavalos e que não é conduzido pelo Rei do Rock.



Um aspecto curioso neste De Tomaso eram os seus farolins traseiros, que eram "roubados" a vários modelos da Alfa Romeo, inicialmente aos 1750 Berlina, depois aos 2000, e por fim ao 33. Esta prática é mais do que comum entre os vários supercarros do mundo, tentem identificar de onde vêm as ópticas traseiras dos TVR ou do Jaguar XJ220. P.S.: Isso torna-se viciante.



O De Tomaso Pantera é facilmente um dos meus carros favoritos, para além de ser lindo de morrer em todas as suas versões, foi mesmo um carro perfeito, não há nada negativo que possa dizer sobre ele, excepto que não sou dono de um. 10/10.











Gonçalo Sampaio, no Vício dos Carros
Comments